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DA (IM)POSSIBILIDADE DA RESTITUIÇÃO DOS VALORES DETIDOS EM CORRETORAS APÓS A FALÊNCIA SOB A ÓTICA DO JULGAMENTO DO RESP Nº 2.110.188/SP

Autores: Carla Gruner e Gabriel Neves Com a decretação da falência pelo juízo competente, os credores que não possuem privilégio no recebimento de seus créditos, conforme a ordem de pagamento disposta nos artigos 83 e 84 na Lei nº 11.101/05 (Lei da Recuperação Judicial e Falência – LRF), dificilmente verão seus créditos serem adimplidos.


Contudo, bens de propriedade do credor, sob posse do falido, poderão ensejar pedido de restituição, conforme prevê a legislação. Nesse contexto, chegou ao Egrégio Superior Tribunal de Justiça (STJ) por meio do – RESp nº 2.110.188/SP – a discussão sobre a possibilidade de restituição dos valores depositados em corretora de valores mobiliários, na data da decretação da liquidação extrajudicial, posteriormente convolada em falência. Especificamente, discutia-se se tais recursos poderiam ser objeto de pedido de restituição ou o cliente deveria ser habilitado na classe dos credores quirografários, portanto, sem qualquer privilégio no recebimento de seu crédito.


Inicialmente, em primeira instância, foi ajuizado pedido de restituição dos valores depositados. Porém, tal pedido fora julgado improcedente pelo juízo da comarca de São Paulo/SP, sob o argumento de que ao deixar os valores “parados” em sua conta de investimento no momento da liquidação extrajudicial da corretora, o autor do pedido assumiu os riscos do negócio, devendo para tanto, ser considerado como credor quirografário da sociedade falida.


Em face dessa decisão, foram opostos embargos de declaração, em que o autor alegou que havia deixado este numerário parado na conta apenas por 2 (dois) dias, visto que vendeu ações que detinha para comprar Letras do Tesouro Nacional, porém ao adquirir este investimento de renda fixa, a operação foi bloqueada, devido a liquidação extrajudicial da corretora.


Com isso, foi interposto recurso de apelação, no qual a Col. 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, reformou a decisão de 1º grau, a fim de acolher o pedido de restituição requerido pelo apelante.


Inconformada, a corretora interpôs Recurso Especial, alegando violação aos artigos 85 e 86 da LRF e defendendo que os valores estariam sob sua disponibilidade, devendo prevalecer a paridade entre os credores, além de apontar divergência jurisprudencial com o RESP nº 1.801.031/SP, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi.


Com isso, a Terceira Turma do STJ, de maneira unânime negou provimento ao recurso, pelos seguintes fundamentos, que serão abaixo esmiuçados.


Primeiramente, o Ministro Relator Ricardo Villas Bôas Cueva, esclareceu que a falência de uma instituição financeira bancária, já foi objeto de controvérsia no Superior Tribunal de Justiça – a exemplo do RESP 1.801.031 mencionado pela corretora –, no qual pacificou-se o entendimento de que os valores depositados na conta bancária não podem ser objeto de restituição, pois integram o patrimônio do banco (espécie de mútuo bancário), de modo que o mesmo raciocínio aplica-se ao CDB (Certificado de Depósito Bancário).


Assim, em que pese as corretoras também sejam instituições financeiras, estas atuam no mercado de capitais, atuando como intermediária para a compra e venda de títulos e valores mobiliários. Com isso, as corretoras dependem de ordem emanada pelos seus clientes para executar a compra e venda de ativos, não tendo assim, autonomia para agir em nome próprio.


Portanto, diversos são os papeis do bancos e das corretoras, ao passo que o primeiro atua no mercado financeiro em sentido estrito, captando o dinheiro depositado em conta corrente e o repassando a terceiros, enquanto o último tem apenas o poder de cumprir a ordem de seu clientes.


Ademais, cumpre ressaltar que o credor apenas não se beneficiou do Mecanismo de Ressarcimento de Prejuízos (MRP), que assegura o ressarcimento de até R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), pois suas operações seriam realizadas em renda fixa, e não no mercado de capitais.


Com isso, infere-se que em nenhum momento a corretora esteve com disponibilidade sobre os valores depositados pelo cliente, situação diversa do que ocorre com os bancos tradicionais.


Deste modo, restou aplicado no caso a Súmula nº 417 do STF, em que: "Pode ser objeto de restituição, na falência, dinheiro em poder do falido, recebido em nome de outrem, ou do qual, por lei ou contrato, não tivesse ele a disponibilidade".


Outrossim, o nobre Relator traçou um paralelo do depósito da quantia na corretora, como um mandato com poderes de representação, já que os clientes para adquirem os títulos, outorgam poderes para que a aquisição seja possível através de uma corretora, porém tais ativos estarão sempre em nome do cliente.


Por fim, o STJ reconheceu que os valores jamais integraram o patrimônio da corretora falida, caracterizando-se como perfeitamente cabível o pedido de restituição. Este entendimento reforça a importância de que investidores prejudicados pela convolação em falência de instituições financeiras busquem auxílio jurídico especializado para garantir a correta classificação de seus créditos e assegurar o ressarcimento dos valores a que têm direito.


Sobre os autores: Carla Mendes Gruner: Advogada no escritório Oliveira Castro Advogados, atuante na área do Direito Empresarial, com foco em Falência e Recuperação Judicial.

Gabriel Novis Neves Neto é advogado do Oliveira Castro Advogados. Formado em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (2023). Pós Graduando em Direito Empresarial pelo Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais 

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